Histórias de Moradores de Nilópolis

Esta página em parceria com o Museu da Pessoa é dedicada a compartilhar histórias e depoimentos dos Moradores da cidade.


História da Moradora: Maria Helena
Local: Rio de Janeiro
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Encontrando a si na Petrobras

Sinopse:

Maria Helena nos conta sobre sua infância na favela do Rio Comprido e em Nilópolis, sobre a origem de seus pais e avós e sua formação escolar na Escola Júlio Gomes e no ginasial da E.E Paulo de Frontin. Nos fala sobre sua entrada na Petrobras em 1975 como auxiliar de escritório, após muita dificuldades financeiras. Depois, nos fala sobre sua carreira na empresa, passando por datilgrafia, pelo CENPES, contabilidade, área de saúde, RH e finalmente o Sistema de Gestão Integrada, na Refinaria de Duque de Caxias. Fala sobre o episódio do derramamento de óleo na Baia de Guanabara, em 1996. Nos fala também sobre seus casamentos, seus três filhos - Eduardo, Mariana e Luiz Eduardo - e seu balanço de vida.

História:

Maria Helena da Silva, nasci no Rio de Janeiro, no dia 27 de julho de 1957, mais precisamente no bairro do Rio Comprido.

PAIS

Meu pai é Jair da Silva; minha mãe, Cacilda Pequeno da Silva. Eles eram mais do interior, eles eram de Prata. Prata, eu não sei bem se é um lugarejo, um município. Eu estive lá até agora, eu quis conhecer Prata e agora no Carnaval eu aproveitei e fui até lá. Mas eu nem sei se é município de Cantagalo, ou de Cordeiro. É um lugar bem pequeno, e onde tinha aquelas grandes fazendas. Eles são de lá, tanto meu pai quanto minha mãe.

Minha mãe ficou órfã cedo, bastante, 15 anos. Com 15 anos ela ficou órfã. Aí eles eram todos assim. Aí já se dividiram. Minha mãe ficou órfã de mãe com 4 para 5 anos de idade, aí meu avô casou de novo e ela ficou órfã de pai aos 15. Mas o meu avô, antes de casar de novo, ele ficou muito tempo criando os filhos, então a minha mãe era muito apegada. Ela conta que ela chorou mesmo a morte do meu avô por mais de 3 a 4 anos. Todo ano, toda lembrança ela é assim de chorar. E eu amo esse avô como se eu o tivesse conhecido. Porque meus tios, sabe, um amor, um carinho por aqueles pais, assim como se eles fossem presentes. Então, eu conheci. Eu só sei que eles eram também meeiros da Prata, lá das fazendas da Prata, e eram vizinhos dos meus pais. Eles eram todos vizinhos, todos amigos, todos vizinhos. Eles eram vizinhos, desde criança.

Eles se casaram lá e vieram. Aí eu não sei se eles se casaram em Mendes. Esse detalhe realmente eu nunca perguntei. Ah não, eu sei, sei. É que minha mãe foi morar em Ribeirão da Lajes, Piraí, com meu tio mais velho. Aí meu pai, que já trabalhava no Rio - ela casou lá em Ribeirão das Lajes, não foi na roça não. E vieram para o Rio Comprido. Vieram primeiro para Queimados, para uma casa que meu pai comprou, e depois vieram morar mais na cidade, que as meninas nasceram, minha irmã nasceu e eles queriam que as meninas se desenvolvessem, tivessem estudo. E naquela época morar no subúrbio era morar longe. Queimados era roça, roça assim de meu pai chegar três horas da manhã em casa e sair às cinco da manhã para vir de novo para a cidade trabalhar na obra, nas grandes construções daqui de Copacabana.

Meu pai trabalhava como carpinteiro na construção civil. Trabalhou em duas empresas. Nós somos famílias de antigamente, de trabalhar, de ser empregados e ficar muito tempo na empresa. Meu pai trabalhou na antiga empresa Cordeiro Guerra, que era uma empresa antiga na construção também, depois trabalhou na Veplan Residência e se aposentou lá. Ele participou de grandes obras no final de década de 50 a 60. Ele falava muito dos grandes prédios, tipo construção daqueles grandes hotéis da avenida Atlântica. Quase todos foram naquela época, e ele trabalhou e ele se sentia muito orgulhoso de trabalhar naquelas grandes obras. A Veplan Residência construiu uma grande parte da Zona Sul, principalmente Leblon, Ipanema. Foi da época da, primeiro Cordeiro Guerra e depois Veplan Residência, que era uma empresa de grande nome.

AVÓS

Meu avós paternos são umas pessoas assim muito presentes em toda a minha infância. Era o seu Jair da Silva, também, e dona Francisca, Francisca. Engraçado, não lembro o nome completo da minha avó, mas era alguma coisa da Silva, ela tinha um nome no meio. Mas era Vó Chica. A Vó Chica, assim, era o máximo para todos os netos, para todas as noras. Eles moravam não muito distante. Eles eram do Estado do Rio, de Mendes, Estado do Rio, e eles tinham um grande sítio. Então, quando criança, ir para a casa dos avós era o máximo, era tudo o que nós queríamos em toda época, em todo fim-de-semana, se pudesse, era estar no sítio. Porque chegava lá, podia chegar a hora que fosse, a vovó estava sempre pronta para fazer uma janta, para fazer um almoço, para matar um frango, sabe, e providenciar. E lá tinha o chamado rancho, que era a paixão das crianças. Primeiro porque as crianças não podiam entrar, porque o fogo ficava aceso, era aquele fogão de lenha, e ficava aceso dia e noite. E segundo porque as crianças amavam aquilo, estava sempre quentinho lá. Lá tinha lingüiça pendurada no teto, e chouriço, banana no canto, algumas outras frutas, e tinha aquele fogão assim sempre com uma água fervendo. E a minha avó estava sempre pronta para entrar. Porque em sítio da época, a cozinha era só para enfeite. Eles faziam comida, tudo era no rancho.

O rancho fora da casa. Isso, uma construção, tudo em estuque, aqueles estuques. Até tinha que ser. Naquela época as pessoas eram bastante inteligentes. Hoje tem a mesma tecnologia e pouca criatividade. E era aquele rancho de estuque que mantinha-se quente, amadureciam as frutas e mantinha-se a água fervendo o tempo todo, e aí a Vó Chica estava sempre lá. A Vó Chica era o máximo.

Olha, os meus avós eram meeiros, eram meeiros, eles trabalhavam nas fazendas, aquele regime da época, e os filhos também trabalhando. Minha mãe conta que eles, para ir no Carmo - Carmo é um lugar muito conhecido até hoje - eles andavam, assim, dormiam na casa do vizinho, iam a pé, então dormiam na casa dos vizinhos. Então, eu quis conhecer essa trajetória, sem até, eu nem sabia que eu ia estar aqui, mas foi muito legal eu conhecer. Porque esse lugar ainda tem fazenda de escravos, tem fazenda de café, tem grandes fazendas ainda nesse lugar, tanto na Prata, como no Carmo, como naqueles lugares, assim, Cantagalo, Cordeiro. Um lugar muito bonito de se ver até hoje.

É família paterna. Família materna, realmente, meus avós morreram muito cedo, então nós ficamos muito ligados lá no sítio. Então, meu pai tinha quatro irmãs e eu acredito que eram cinco irmãos. Então, todos iam para o sítio. Todos com filhos.

Nós íamos, íamos sim, porque meu pai era aquele tipo, assim, não era o mais velho, mas era um dos mais velhos, que era responsável assim pelos pais. Então, meu avô ficou cego, ele teve uma doença que hoje a gente sabe que é diabetes, mas naquela época não se sabia, e ele ficou cego muito cedo. E era muito difícil. Eles iam para barbear meu avô, para cuidar do pagamento dos impostos do sítio e ver se estava tudo em ordem. Esse sítio tinha a casa grande, tinha o rancho e tinha umas três casas, em que moravam três filhos, e esses filhos ajudavam a minha avó a cuidar da parte do pomar, cuidar das hortas. Que tinha horta só de couve, tinha horta só, assim, com chuchu, cenoura, e tinha assim no alto do morro, que era cana, mamão, aí tinha do outro lado só bananeiras. Mas era uma delícia.

Meus avós maternos eram Margarida Pequeno e Galdino Pequeno. Conheço muito porque eles eram muito amados pelos filhos e os irmãos da minha mãe. E os irmãos da minha mãe e minha mãe já foram criados pelo irmão mais velho. Então, tinha na casa do meu tio mais velho a foto dos meus avós.

INFÂNCIA DE FAVELA

Nós morávamos no Rio Comprido. No Rio Comprido era uma infância de favela, de favela mesmo, porque era muito longe. Por exemplo, o bonde nos deixava na praça do Rio Comprido. Nós andávamos toda aquela Paulo de Frontin, subia a rua para cima do Rebouças, aí chegava até onde vai carro, onde é rua, aí subia o morro de escada. Era morro Santa Alexandrina, não sei, lá nunca teve nome desses morros famosos, lá nunca teve nome de morro, mas era um morro. E um morro que se a gente continuasse subindo chegava no Silvestre, emendava com o Silvestre. Então era assim. O nosso passeio de domingo, inclusive, era lá na estrada: “Ah, vamos passear na estrada!” A minha infância foi muito gostosa. Aquele vizinho que pede sal emprestado, aquelas crianças que se juntam de noite para contar história. Assim, crianças de morro, de favela, mas era diferente da favela de hoje. Não tinha violência. Era uma vida interiorana.

Ah, contava casos, brincava de roda, brincava de passar anel, brincava de contar história. Eu, particularmente, adorava brincar de fazer coisas. Eu gosto muito de fazer crochê, eu gosto muito, e naquela época a minha mãe não sabia fazer crochê, ninguém sabia fazer crochê, mas eu queria fazer crochê. Eu tinha uns 7 anos. E eu disse: “Mas eu vou aprender a fazer crochê!” E no Posto, lá no Rio Comprido, lá na escola pública, na época na escola pública nós aprendíamos trabalhos manuais, e eu logo aprendi a fazer crochê. A professora diz: “O que é que você quer aprender?” “Ah, eu vou aprender a fazer crochê!” você aprendia, por exemplo, a pregar botão, aprendia a fazer trabalhos de palhacinho de festa, aprendi a fazer bolsa de fio de soro. Que do fio de soro você fazia bolsa. Fazia bolsa de fio de soro, fazia carteira de material dobrado, assim, fazia umas dobraduras no papel e fazia uma montagem realmente no papel. E nós fazíamos bolsa, fazíamos carteira. Adoro fazer trabalhos manuais, adoro até hoje. Eu faço crochê até hoje. Quando eu estou meio agoniada eu faço o meu crochê. É terapia. Mas o crochê que faço, que eu me lembro, desde de uns 6, 7 anos, assim, quando foi a primeira coisa que eu quis aprender era fazer crochê. E tinha aulinhas no Posto, que era lá na praça do Rio Comprido, tinha aulinhas de trabalhos manuais e eu ia fazer crochê. Aí eu logo aprendi a fazer crochê, aí eu me lembro que aos 10 anos eu fazia crochê para vender, eu fazia paninho de mesa. Eu adoro trabalho. Porque era muito necessário, meu pai ganhava muito pouquinho, a minha mãe lavava roupa para fora. Uma coisa que me marcou muito na vida do morro é que lá morro tinha um rio, então não tinha água encanada, então tinha que carregar água no balde, então a minha mãe lavava roupa para fora e equilibrava uma tina na cabeça, equilibrava bacia de roupa na cabeça. Então, isso marcou muito a minha infância. Não foi triste, mas foi muito sofrida, muito assim. Aquela casa de estuque que meu pai queria transformar numa casa de tijolo. Então, a gente não passava necessidade, mas tinha que... Não podia comprar roupa, não podia comprar sapato, não podia. Eu só tinha mesmo uma saia, que era a saia da escola, aquela saia azul-marinho e tinha uma camiseta, que hoje em dia é tipo uma camiseta Hering, que hoje em dia a gente tem uma gaveta cheia, e eu tinha uma. E era a roupa de passeio. E a roupa de escola era aquela blusa branquinha, com a saia da escola e o sapato, que era aquele sapato horroroso que ninguém gostava, mas era o único que eu tinha. E eu amava aquele sapato preto de plástico, de borracha, que agora é moda, da Xuxa, mas naquela época era para pobre, para muito pobre. Mas isso não me... Eu estudava muito, eu estudava na escola pública, mas eu era aluna, assim, exemplar.

PRIMÁRIO EM ESCOLA PÚBLICA

Escola Júlio Gomes, escola pública. Júlio Gomes, no Rio Comprido. E na escola eu tirava o máximo proveito, eu curtia, eu gostava. Porque eu falava para mim, sem, assim, sem dores, sem aquela coisa assim, sem angústia. Eu dizia: “Eu vou estudar, vou trabalhar numa grande empresa!” Aí a minha mãe investia muito, a quem ela podia pedir para emprestar livros, eu estava sempre lendo. Trazia revistas da casa das patroas da minha mãe. Mas a minha irmã tinha bastante dificuldade. Era mais velha, minha irmã é 3 anos mais velha do que eu, ela é de 1954. E minha irmã tinha mais dificuldade em aprender. E eu aprendia assim porque aquilo para mim era a vida. Eu aprendi os trabalhos manuais, eu era do coral da escola, eu era do conselho de escola, eu hasteava a bandeira, então estava sempre junto com os professores.

A escola pública naquela época era realmente, para mim, ela estimulava, mas a gente sabe que não era bem aquela coisa. E eu tinha muitas dificuldades em casa. Não de estudar, mas financeiras, porque todo dinheiro que meu pai recebia ia para a reforma, para a casa. Por isso que eu detesto obra. Eu vivi a minha vida toda em obra, em construção. Pois a idéia era transformar uma casa de estuque em uma casa de tijolo, com azulejo e com piso de tabuinha, que minha irmã chamava de piso de tabuinha, que era bonito. Era taco.

Nunca tive essas exibições de saber mais. Eu nunca fui aluna nota dez, nunca fiz questão. Eu era estudiosa e tirava realmente notas dez, mas nunca dez em tudo. Os professores que mais marcaram foram os professores primários, todos, inclusive a Maria Helena, porque a Maria Helena tinha muita paciência comigo porque eu era muito exigente, fazia muita pergunta. Maria Helena foi, assim, aquela educadora, que hoje a gente coloca o filho no pré-escolar, no maternal, a Maria Helena fazia isso, assim, dava aula na casa dela e alfabetizava as crianças da favela. Ela alfabetizava todos. E ganhava lá uma mixaria, que eu não sei quanto era. Ela morava na favela, e a sala dela era uma escola, e ela alfabetizava as crianças. E tinha criança que ficava só com aquela alfabetização, não ia para a escola, e ficavam. Mas meu pai, a necessidade do meu pai era muito grande de que a gente estudasse, então ele logo foi colocar a gente na escola pública.

A minha irmã mais velha tinha mais dificuldade de aprendizagem, a escola pública era muito puxada, aí depois ela andou repetindo umas séries no ginásio - não era nem primeiro e nem segundo grau; no ginásio. Ela foi estudar numa escola paga, mas meu pai conseguiu uma bolsa. Ela foi estudar numa escola militar, inclusive. É a única - era a única, não sei - escola militar de meninas no Rio de Janeiro, que é a Fundação Osório. Então, a minha irmã estudava na Fundação Osório e eu continuava na escola pública. E segui a minha trajetória na escola pública, fiz o ginásio. Pessoas que marcaram foi a Maria Helena, muito, muito, até hoje. Ela era autodidata, mas tinha uma técnica, assim. Professora formada que me marcou no primário, nenhuma. Engraçado, nenhuma que eu me lembro. Agora, de ginásio eu tenho umas: professora Mirian, professora Mirtes, professor Herven.

Eu comecei a estudar com 3 anos e meio, com 4 anos eu já lia, eu lia. A minha mãe ainda me levava no colo. Aí a Maria Helena falou assim - ela é minha xará -, e eu conversei à beça com ela: “Ah, Helena, eu quero tanto te ver, você era uma garotinha tão esperta!” Com 4 anos eu já escrevia e lia, e conhecia as letras todas. E quando eu fui para a escola eu já sabia ler e escrever tudo. Fui para escola e já entrei na segunda série, na época, porque eu era muito boa para isso.

GINÁSIO

Aí eu estudava no Paulo de Frontin, um colégio que existe até hoje na Haddock Lobo, era uma escola também só de meninas, que a gente tinha que estudar muito para passar para um colégio estadual, e eu fui para o colégio estadual com 11 anos. Primeiro ginasial. E era o orgulho da favela, não era orgulho dos meus pais não, era orgulho de todos da favela eu estudar na Escola Estadual Paulo de Frontin, que era uma escola em que só estudavam meninas. Então, não era qualquer um que passava naquela escola. Ninguém passou, ninguém passou, eu era a única que fui, estudei e passei.

Em casa nós já tínhamos tabuinha no piso. Já tínhamos a sala com taco e já tínhamos cozinha com azulejo. Porque meu pai comprava um azulejo. Cada vez que ele passava na loja de ferragens, ele comprava um, dois, três azulejos, trazia e colocava. E foi assim que ele foi botando azulejo, aquela cozinha toda branquinha, com azulejo branco e piso de pastilha branca. Já tinha luz. Aí já tinha água encanada também. Porque quando era um barraco era horrível.

A gente já está caminhando para 1968. Aí a mamãe trabalhava em casa de família, aí eu já não tinha mais só aquele sapato, tinha uma sandalinha. Aí eu já tinha uma roupa, que a minha mãe começou a costurar para fora, aí a gente aprendeu a costurar, aí a gente já costurava. Aí a gente costurava e tirava dinheiro também. Quando a minha mãe lavava roupa, então, eu e minha irmã entregávamos, então a minha irmã entregava em Copacabana e eu entregava na Tijuca. Isso no ginásio. Então, eu ia para escola na Tijuca, que eu morava na Tijuca, então eu ia para a escola de manhã e antes da aula eu deixava a roupa limpa e quando voltava da aula eu pegava a roupa suja e levava para minha mãe lavar. Aí a gente dividia o dinheiro, a minha mãe dava metade do dinheiro. Porque a gente precisava, era ginásio, então a gente já queria dar uma saidinha, então dividia o dinheiro com a gente, que a gente entregava a roupa. Ela só lavava, e a gente entregava.

Eu gostava do professor Herven, de matemática, a professora Míriam. A professora Míriam era português, e acho que era Elza, professora de trabalhos manuais. Que no ginásio nós tínhamos muitos trabalhos. Era professora de artes, não era trabalhos manuais, não, era professora de artes. Mas nas artes ela focava mais trabalhos tipo dobradura, que hoje é dobradura, mas naquela época não. A gente aprendia a fazer esses enfeites de mesa, aprendia a fazer vários tipos de trabalhos no papel sanfona, de enfeite de época de festa de Natal, para enfeitar, fazia lanterna de papel.

Eu me formei, me formei professora, voltei a estudar. Me formei, não sei assim. Quando eu me formei eu já estava na Petrobras. Eu voltei a estudar, aí eu fui estudar lá, aí lá o profissionalizante que tinha era contabilidade, e eu não fui fazer, não. Eu estudava em Guadalupe, não estudava em Nilópolis, não, porque era mais rápido. Porque eu vinha de ônibus, saltava na avenida Brasil e já chegava no horário na escola. Aí eu fiz o Normal. Era aquela trajetória: você faz contabilidade, eu comecei contabilidade e aí parei. Fiquei um tempo sem estudar realmente, fazendo um cursinho, fazendo outro, e tentando fazer inglês. Porque a gente fica um tempão, entra no inglês e sai, e entra no cursinho de não sei o quê e sai. E passou muito rápido esse tempo. Eu acho que formalmente, nessa época, eu fiquei uns 2 anos. Dos 16 a mais ou menos os 18, 19.

O MORRO

A maioria dos vizinhos eram alguns que já tinham feito família. Lá era tipo casa de posse, então a maioria dos vizinhos já moravam lá porque os pais moravam lá, aí fizeram as casas e foram continuando lá. O meu pai, que veio de fora, algumas pessoas vieram também do Norte e Nordeste, naquela tinha muita migração, né, do Nordeste para o Rio, por causa da construção civil, então tinha muito nordestino. E muitos vizinhos que já moravam lá, porque os pais moravam, o filho casou e fez uma casa lá. Então, eram vizinhos muito achegados, vizinhos assim de cuidar, vizinhos que eram comadre, compadre. Todos os padrinhos nossos eram vizinhos, minha mãe madrinha. Mãe de leite, né, mãe de leite, a gente mamava na vizinha, porque acabava leite da mãe. Eu mesmo tenho a minha mãe de leite, que é minha madrinha, que mora lá até hoje. Hoje eu não sei. Não sei, não é por discriminação, não sei se é por falta de tempo. E hoje é porque é um lugar muito perigoso, como toda favela do Rio. Então, hoje eu sou uma estranha. Sinto muita saudade. Meu pai é uma pessoa que vai lá. Mas quando eu me casei, meu marido dizia: “Meus filhos nunca vão na favela, meus filhos não vão na favela!” Aí nunca mais fui. Muitos conhecidos mudaram para outros bairros, porque ficou muito perigoso; os conhecidos mudaram. Até noutro dia eu estava na casa da minha mãe e ligou para lá a minha primeira professora.

No Cristo a gente não ia não, mas todo domingo a gente passeava. Eu morava no meio da favela, mas nós tínhamos vizinhos que moravam lá perto da estrada, sabe, os vizinhos moravam perto da estrada. Então, nosso passeio de domingo à tarde, quando não era a igreja, era ir lá passear na estrada. Íamos até o Dois Irmãos, nunca passamos dali, porque já era muito longe, mas nós íamos até o Dois Irmãos, que é Santa Tereza. Lá emenda lá em cima com o Santa Tereza. Ah, era ótimo passear. Aí passava na casa dos vizinhos. Eu me lembro, assim, a primeira vizinha que teve geladeira, uma geladeira à querosene, aí todo mundo ia lá na casa dela ver a geladeira.

Na favela as pessoas subiam com as coisas nas costas, com todo o tijolo, com todo o material de obra, nas costas. Era um trabalho de comunidade, era aquele trabalho comunitário, de mutirão. Todo mundo lá fazia obra, faz até hoje, na base do mutirão. Hoje não, hoje a areia vem ensacada, hoje você tem outras formas de comprar, mas naquela época comprava-se caminhão de areia. Dois, três vizinhos se juntavam e compravam um caminhão de areia, aí todos se juntavam também para levar no balde, nas costas, na lata de 20. Crianças menores levavam na lata de 10. Eu nunca carreguei não, eu não carregava não. Não carregava não.

ESPIRITISMO

Olha, religião foi uma coisa muito marcante na minha vida, porque a minha mãe sempre foi uma pessoa que influenciou muito a minha vida e minha mãe é uma pessoa fanática em religião. Minha mãe era espírita fanática, então nós tínhamos que ir ao centro espírita. A minha mãe ia num centro lá no Catumbi, que era uma outra favela também, e que tem até hoje, a favela do Catumbi. E a minha mãe ia no centro lá e a gente tinha que ir. Eu não gostava. A minha irmã eu não sei, mas eu não. Tanto que eu não fiz primeira comunhão, eu não me batizei. Eu não sou muito de igreja, não. E aí a minha mãe ia no centro e ia na Igreja Católica também. Então, nós tínhamos que sair de anjo na procissão, e isso era horrível. Eu não gostava, nem ligava. Tinha que ir na missa, tinha que ir na reza. Aí ela fazia aquela roupa de anjo, porque ela sabia costurar, fazia uma roupa de anjo, e a gente tinha que sair. E aí a gente não podia ir no samba, e eu adorava o samba, eu adorava realmente o samba e eu não podia ir no samba. Porque no morro, lá na favela tinha quadra. Toda favela que se preze tem quadra e tem o bloco. Meu sonho era sair no bloco. Era Unidos do Paula Ramos, que deve ter até hoje. Mas tinha o morro da Paula Ramos e tinha o morro da Santa Alexandrina, que são dois. E nunca podia sair no samba, a gente só podia olhar. E aquilo, assim, era ruim de ficar olhando.

Tinha a época do Carnaval. Tem o pré-Carnaval, que tem o ensaio, né, e tinha o bloco. O bloco, sei lá, saía na cidade, eu não ia. Eu só via o bloco por causa da minha mãe. Deixa eu contar a história da minha mãe, de igreja. Aí a minha mãe saiu da igreja e começou a estudar a Bíblia, e aí foi ser crente. E as filhas eram crentes. E meu pai não ia, não vai de jeito nenhum na igreja. Meu pai foi uma vez, visitou a igreja e nunca mais foi. Eles brigavam por causa disso. Muita desavença, meu pai era contra, era contra sair. Porque igreja tem aquele negócio: vai, viaja, tem excursão, tem congresso, tem essas coisas todas de igreja. E a gente ficou na igreja, e aí é que a gente não podia ir no samba, e que eu não podia ir no samba, nem olhar eu podia mais. O pastor não deixava. Minha mãe não permitia, e o pastor, nunca, né? O pastor não permitia. E a gente foi vivendo naquela comunidade de igreja, de congressos e daquela comunidade da igreja. A minha mãe era um fato isolado. Muita gente não. As pessoas são muito crentes hoje, naquela época não. As pessoas iam na igreja católica, as pessoas não eram muito crentes, a minha mãe era um fato isolado. Na igreja a que a minha mãe pertencia a gente não podia fazer festa de aniversário, e eu adoro uma festa. Mas eu era muito ligada a minha mãe, porque minha mãe é uma pessoa muito amiga. Isso aí são coisas, assim, que marcam. Por exemplo, não podia botar short, só andava de saia compridinha. Não podia cortar o cabelo, mas a gente não cortava porque não cortava. Mas podia, podia arrumar o cabelo. Não podia usar calça comprida. Isso já era para 14, 15 anos.

Porque a minha mãe é Testemunha de Jeová, e as pessoas Testemunhas de Jeová são mais flexíveis, são muito legais, mas são muito sérias, são muito rigorosas, né, eles são muito sérios, como minha mãe é até hoje. A minha irmã é Testemunha de Jeová até hoje. Meu pai, ele dizia: “Ah, você que sabe, se acontecer alguma coisa com as meninas, a responsabilidade é sua!” Então, por isso ela fazia isso. Coitada! Porque ele trabalhava de noite, ele não cuidava realmente da gente. Eu fui conversar mais com meu pai já casada. Que meu pai, até a gente casar. Porque quando eu me casei o meu pai estava aposentando. Olha como ele trabalhou cedo também, né? Tanto que com o dinheiro da aposentadoria ele fez o meu casamento e fez o casamento da minha irmã, com o dinheiro da aposentadoria.

Olha, minha mãe acabou com a minha adolescência, meu querido, a minha mãe deu um corte na minha adolescência, assim, de namoradinho. Eu namorava às vezes, claro que sim, mas muito pouco. Aparecia um namorado: “Ah, namorado não é da igreja, não pode!” E a coisa ia caminhando por aí. Eu não tive muita adolescência, não, a minha adolescência não tem fatos marcantes, sabe, de dar uma fugidinha no cinema, era tudo assim muito, assim, ela direcionava. Domingo era na igreja, as festinhas só as que a igreja proporcionava. E aí a gente foi crescendo, até que eu fiquei adulta. A minha saída era essa: para a escola, para o trabalho ou para a igreja.

MUDANÇA PARA NILÓPOLIS

Foi em 1972, quando a gente começou a se preparar para se mudar do morro. O morro começou a ficar mais complicado, era mais difícil para a gente estudar, meu pai não queria mais aquele ambiente do morro para mim, que estudava muito, ele preferia as filhas estudando, aí nós fomos morar em Nilópolis.

O morro já não era um bom ambiente, porque ninguém estudava, ninguém tinha aquele incentivo de estudo, as escolas eram longe. Por exemplo, eu morava no Rio Comprido e estudava aqui no Largo do Machado. Então tinha que pegar ônibus, e as escolas terminavam 11 horas da noite, porque aos 14 eu já trabalhava na fábrica, então tinha que estudar de noite. E aí meu pai falou: “Ah, está muito ruim aqui, a gente não consegue terminar a casa, as meninas não têm quarto.” Porque não tinha quarto, nós nunca tivemos quarto, quarto de dormir. Minha mãe dividia o quarto dela com um armário, um guarda-vestidos, então a gente nunca teve quarto. A gente não tinha cama, a gente dormia em cama de armar. Conhece cama de armar? Era cama de armar.

Era uma casa atrás das outras. Tinha um beco, assim, e a minha casa era a última do beco. A única vista que eu tinha da cidade é que meu pai tinha uma escada nos fundos e tinha um terraço, e a gente avistava até os fogos aqui em Copacabana. Mas no terraço. Mas dentro de casa tinha janela, mas não tinha visão nenhuma, porque dependendo do morro, da casa que se faz, não tem visão. Era casa de fundos mesmo.

Nós fomos morar em Nilópolis um pouco antes de eu entrar na Petrobras; eu tinha uns 16 anos, por aí. Quando isso? 1974, né? Foi quando nós saímos do morro, em 1973, 1974. Meu pai queria sair do morro, mas demorou, porque ele tinha que comprar alguma coisa, né, então ele teve que juntar um dinheiro e comprar alguma coisa. Vendeu o que ele tinha no morro. Mercado de compra e venda acho que vai existir a vida inteira. Hoje a gente está sempre vendendo, a gente está trocando, a gente está sempre mudando. Eu não escolhi morar em Nilópolis, não sabia nem onde era. Meu pai conhecia lá um amigo dele lá da obra, que tinha essa casa e queria vender porque queria comprar outra. E meu pai foi lá, gostou, aí nós fomos lá, ele perguntou se a minha mãe gostou, todo mundo gostou. Tinha umas árvores. Quer dizer, era completamente diferente da casa do morro, porque era um quintal só nosso. Era num plano, era um quintal só nosso, uma casinha lá, e era mais confortável, era perto da condução. “Ah, que sonho bom!” O que a gente caminhava para chegar em casa, era assim um século. No morro já tinha ônibus. O ônibus ia até ali onde tem a entrada do Túnel Rebouças, e continua subindo, subindo. E o sonho nosso era morar perto da condução. Em Nilópolis era uma casa de alvenaria. Não era uma casa grande, não, mas era uma casa de alvenaria. Eu não me lembro, porque nós mudamos e eu já trabalhava, aí eu cheguei lá e eu não gostei de morar em Nilópolis, porque era longe. Aí tinha a condução, mas era longe. Gente, as conduções passavam na porta. A gente morava perto da estação - minha mãe mora até hoje lá -, mas era longe da cidade. Foi aí que eu percebi como eu gostava de morar na cidade. A cidade, a cidade para mim era a minha vida. Eu acho que você tem que estalar o dedo e as coisas têm que estar por perto. E lá não tinha nada por perto. Aí é a ambigüidade das necessidades, é você querer coisa que não tem.

FÁBRICA DE RENDA UNIDOS

Eu trabalhava na Fábrica de Renda Unidos. Para dizer a verdade eu não trabalhei muito tempo lá, não, porque eles queriam que eu trabalhasse mais do que eu podia. Quer dizer, assim, aquele ambiente da fábrica não... Alguém falou para mim que lá na Fábrica da Usina - eu morava no Rio Comprido - estava inscrevendo meninas para trabalhar, aí eu fui lá, me inscrevi, e a moça mandou. Era na Usina, Bairro da Usina aqui no Rio. Você fala Usina, no Rio, é uma coisa conhecida, é um bairro bem conhecido. E aí eu fui lá, eu queria trabalhar já, eu já tinha terminado o meu ginásio, eu queria trabalhar e fui lá e me inscrevi. Me inscrevi e aí na segunda-feira a moça mandou eu começar, porque eles estavam admitindo menores. Pegava assim 15 para as sete no apito da fábrica. Se apitava seis e meia, você tinha que estar entrando, 15 para as sete você tinha que começar a trabalhar. Aí eu fiquei naquela transição de como é que eu ia fazer para estudar, aí eu fui estudar de noite. Eu estudava no básico, naquela época era o básico. E eu entrei para fazer o profissionalizante de contabilidade. Aí nós fazíamos dois dias no Paulo de Frontin e três dias no Amálio Cavalcante, aqui no Catete. E era assim longe demais, e papai achou: “Ah, essa menina está se sacrificando muito porque vai para a fábrica cedo, chega às 11!” Na fábrica eu trabalhava, acho que era até quatro e meia. Era uma fábrica de renda. Fazia renda, fazia aquele tecido bordado, fazia muito tecido bordado, renda. E nós trabalhávamos assim, tipo assim: você já viu biombos de prisão? Por isso que eu fiquei lá um mês e meio, dois, mais ou menos. Porque a gente trabalhava num biombo de prisão, umas peças, assim dessa altura, de renda. Porque a renda que a gente compra fininha, elas vêm uma peça, uma peça larga assim. Não sei hoje, mas naquela época elas vinham numa peça. Entre uma renda e outra tem um fio, então a gente trabalhava puxando aquele fio. Você achava o fio e puxava, aí desfazia, aí ia para uma outra menina que enrolava. Cada peça tinha 100 metros, né? Aí ela fazia aquele rolo que a gente compra de peça de renda. Mas ela é feita numa peça inteira. Deve ter. Você desfiava aquilo à mão. E nós trabalhávamos sentadas assim, em cadeiras assim, num biombo, tipo assim aquelas celas de prisão, sabe? Não tinha café, não tinha água, era um troço meio esquisito. Era registrado, era registrado direitinho. Eu tenho registro na minha carteira, eu tenho carteira assinada desde essa época. Catorze anos, era meio salário mínimo; dezessete anos era 75% do salário mínimo, e aí 18 anos era o salário mínimo completo. Havia muitas meninas, inclusive daqueles morros da favela da Usina e tudo. Mas eu não gostei muito, não sei.

Não, nunca se ouve no Rio isso de chamar as pessoas, no Rio nunca teve disso. Trabalho era uma coisa que você procurava. Mas minhas colegas, minhas vizinhas achavam que eu não precisava trabalhar, porque eu cheguei no colégio, no Paulo de Frontin, em que só estudavam meninas ricas da Tijuca. As meninas eram filhas de pais advogados, pais médicos, pais diretores de empresa, não eram meninas pobres. Não, no morro ninguém procurava emprego, não, o pessoal do morro não procurava emprego, não. Jovem principalmente, de 14, é ruim, é difícil procurar emprego. Eles estudavam e faziam nada, eram muito jovens, crianças, ou não estudavam, faziam filhos. Já naquela época as meninas já tinham filho cedo.

ESCRITÓRIO DO DR. JOEL

Na fábrica fiquei coisa assim de uns meses, e aí logo eu fui trabalhar. A minha irmã trabalhava com esse empreiteiro no escritório do doutor Joel, aí ela recebeu um convite para trabalhar no outro escritório, e aí eu fui para lá. No início ele não queria não, porque eu era muito novinha, muito garota. Aí eu comecei, e ele falou: “Não, a menina é muito inteligente!” Eu estudava. Naquela época não se pedia currículo, mas eu tinha currículo, né? Já escrevia bem, já sabia datilografia. Eu fui à aula, eu não fiz o curso, mas eu aprendi, e depois achei muito enjoado continuar e eu saí do curso. Mas eu aprendi, não fui à aula. Naqueles cursos antigos que tinha, da Olivetti, Remington, e eu me tornei uma exímia datilógrafa. Para passar na Petrobras naquela época tinha que ser uma excelente datilógrafa. Fiquei no Joel quase 2 anos. Eu fazia tudo. Era departamento pessoal, era contabilidade, era emitir nota fiscal, era ligar para cliente. E ele fazia as obras, ele ia lá para junto das obras junto com os empreiteiros e ficava eu e um outro rapaz, que era o Jorge, que entendia bastante de escritório. Eu tinha 15 anos, nessa época. Aí eu fui para o curso de contabilidade, aí depois, quando a gente mudou para Nilópolis, o curso ficou muito longe. Tudo ficou muito longe. E aí eu fiquei um ano, eu acredito, sem estudar. Fiquei um ano sem estudar , fiquei um períodozinho pequeno sem estudar, aí saí do Joel e vim para a Veplan Residência, porque meu pai: “Não, vai para uma empresa grande, minha filha. Você estuda muito. Eu vou pedir lá ao moço do departamento pessoal - meu pai trabalhava na Veplan Residência - para fazer um teste com você e ver se você passa!” Cheguei lá e fiz o teste assim e: “Está admitida!” Porque eu estudava à beça. Mas ele falou assim: “Mas o problema é que ela tem 16 anos e pouco para vir para cá para a Veplan Residência!” Era muita responsabilidade para as empresas admitir menor, né, mas aí ele falou assim: “Mas o teste dela foi muito bom, eu vou admitir ela!” E eu fiquei lá.

VEPLAN RESIDÊNCIA

Era no centro, aqui no centro da cidade. Aí era aquela lonjura, pegava o trem, pegava o ônibus para vir trabalhar aqui na Rua México. O salário tinha melhorado. Não, com o Joel não. No Joel eu não me lembro quanto eu ganhava, mas eu acho que era um salário mínimo. Mas na Veplan eu cheguei a ganhar, vamos dizer, que hoje eu ganhasse assim, em relação à época, ganhasse assim uns 600, 800 reais. Ganhava bem. Aí a vida melhorou, né?

Eu ajudava em casa, fazia compra. Aí a gente começou a ajudar meu pai a fazer uma nova obra. Porque meu pai saiu de uma obra e foi fazer outra. Aquela casa não atendia, aí ele foi fazer uma casa nova. Ele simplesmente fez um barraco nos fundos e foi fazer a casa da frente. Eu detesto obra, gente, vocês não sabem que o meu trauma é obra. E meu pai saiu da casa dos fundos e foi fazer a casa da frente, que é a casa em que a minha mãe mora hoje. Uma casa com um quarto enorme para as duas filhas, com uma cozinha enorme com azulejo. Só que ele fez a casa, mas depois ele não tinha mais dinheiro para fazer o acabamento. Aí eu já ganhava bem na Veplan Residência, aí mobiliei a cozinha, aí comprei os móveis de quarto, fiz os quartos. Aí quando a casa estava pronta eu casei. E não usufruí a casa.

Eu nunca fui na quadra da Beija-Flor. Não. Eu já passei na porta. Olha, o meu primeiro namorado não era da igreja, era da Petrobras. Aí aos 18 anos eu fui para a Petrobras, da Veplan. Eu tirei meus documentos em julho, o concurso abriu em setembro. Tirar documento de identidade. Quer dizer, antes eu não sabia que antes eu podia tirar carteira de identidade, eram os pais que tiravam, né? Mas os meus filhos têm carteira de identidade desde cedo, mas eu tirei a minha carteira de identidade aos 18, ali na Graça Aranha. Eu saí lá e falei: “Jorge, eu vou tirar a minha carteira de identidade, porque eu vou fazer o concurso para a Petrobras logo que abrir.” Eu fui fazer o concurso para o Banco do Brasil, e na Veplan Residência os meus gerentes lá, os chefes davam muita força. “Não, você vai sim!”

Meu anseio profissional era trabalhar na tal da empresa grande, era, assim, trabalhar num escritório maior, mostrar o meu trabalho, as minhas atividades. Eu imaginava assim que lá era assim um mundo bem melhor. Quer dizer, financeiramente era, porque depois que eu mudei para a Petrobras eu pude proporcionar à minha família muitas outras coisas, e pude pagar os meus estudos melhor, pude estudar. Eu cheguei até a começar a faculdade. E aí logo arrumei um namorado na Petrobras, e estava dando certo, a gente estava ali, quase ficamos noivos. Mas a minha mãe não queria o namoro, e eu acabei desmanchando o namoro e casando. Conheci um outro, que a minha mãe gostava dele, que era da igreja, e casei com ele. E ele falou: “Ah Lena, você não vai estudar mais, porque eu acho que você pode engravidar!” “Ah, então faz isso!” Aí, como tinha aquele noivo que era da sede, ele falou assim: “Sai da sede, vai para a Reduc!” Aí foi quando eu me transferi para a Reduc.

Porque eu trabalhava na Veplan, e meu chefe naquela época, o Jorge, também Jorge, ele falava: “Não, você não vai ficar aqui na Veplan, você vai adiante!” E eu fui tirar os meus documentos. Foi aí que a gente parou, né? Eu fui tirar a identidade. Ir adiante era trabalhar numa empresa grande. Na época era a Petrobras, era o Banco do Brasil, BNDES, eram as grandes empresas. As três estatais. Era assim concurso, já dava um status de melhora a quem trabalhava. Eu lembro que o meu foco era Petrobras, Banco do Brasil e BNDES. Mas eu não tinha 18 anos, eu tinha que fazer os 18 anos. E aí eu me lembro que no dia 27 de julho eu fiz 18 anos, no dia 28 eu fui lá tirar a minha identidade, eu fui lá dar entrada.

Fui lá tirar a minha identidade, e quando saiu a identidade... Ah, nesse período, você falou em estudo, a gente se lembra, a gente volta a lembrar. Eu fiz um curso de secretariado. Naquela época era na Fundação Getúlio Vargas, que tinha uma unidade que tinha uns recursos pequenos. Aí eu aprendi estenografia, fiquei uma exímia datilógrafa e aprendi muito de português, literatura, era um curso completo de secretariado.

Isso tudo à noite. É, eu vivia procurando curso, principalmente cursos baratinhos, cursos grátis. E a fundação naquela época tinha um núcleo que dava um curso excelente. Inclusive, você fazia uma prova, tinha uma prova de português e matemática para saber se podia fazer o curso de secretariado. E eu fui fazer o curso de secretariado. Vê como é que passou assim, né? Aí eu fiz o secretariado na Fundação Getúlio Vargas e fiquei mais assim, fiquei bem. O Jorge falou assim: “Não, Lena, agora você vai fazer o concurso e vai passar, não tem por que não passar!” E realmente, eu fiz o curso...

NAMORO

Esse primeiro namorado da Petrobras, esse primeiro namorado assim que eu tenha gostado, para mim era uma pessoa muito simples. Era um rapaz que me ligou, um dia eu atendi o telefone na minha mesa, e ele falou assim: “Você sabe quem está falando?” Eu falei: “Não, quem está falando?” “É uma pessoa que te admira muito, que te vê!” Aquelas coisas, de tentar falar com alguém. Ele era segurança, na época eram os vigilantes, e ele era da segurança. E era uma pessoa que eu tinha admiração, a gente se via todo dia: “Você passa tão séria, será que você é séria assim mesmo?” Falei: “Sou séria sim, não sei o quê.” Aí nós ficamos conversando por telefone, assim, um bom período, até que a gente resolveu se conhecer. As coisas só se modernizam, as pessoas não mudam muito, os seres humanos não mudam. Aí nós ficamos um tempão, e aquela expectativa: quem é, quem é, quem é? E aí eu resolvi saber quem era: “Vamos nos encontrar!” Aí um dia eu estava saindo da folga. Não, um dia ele foi lá no meu andar. Ele já tinha ido várias vezes lá no andar. Mas não se identificava, eu também não sabia quem era, e eu também muito, muito quieta, muito séria, eu não ficava prestando atenção, não prestava nenhuma atenção, não. E aí ele decidiu se apresentar, a gente namorou um bom tempo, e acho que se minha mãe não corta mesmo, assim, a gente chegaria até a casar. Eu apresentei a minha família, eu nunca tive esses mistérios em casa de conhecer alguém e não contar, namorar na rua - não, eram pessoas que iam na minha casa.

INGRESSO NA PETROBRAS

Tirei os documentos em julho ainda. E nesse curso de secretariado eu conheci uma moça chamada Luiza, que estava fazendo concurso para a Petrobras e estava nesse curso. E a Luiza ficou minha amiga, é minha amiga até hoje, mas a gente perdeu o contato. E a Luiza falou assim: “Helena, em outubro vai abrir o concurso para a Petrobras, fica de olho!” Aí no dia da inscrição ela me ligou e falou: “Helena, a inscrição está aberta!” E eu fui fazer a inscrição - e não tinha esse negócio de pagar, você ia lá na sede, lá no departamento pessoal, fazia a sua inscrição e eles marcavam uma prova. Aí veio o telegrama para você ir fazer a prova. Mas nesse ínterim abriu também o concurso para o Banco do Brasil, e eu fiz inscrição para o Banco do Brasil; e abriu também concurso para o BNDES, e eu fiz inscrição para o BNDES.

Nesse ínterim. Tudo em 1975, nesse período de outubro a novembro. Aí eles chamaram para as provas e foi assim final de novembro para dezembro. Datilografia, e resultado: passei! Português, e resultado: passei! Aí tinha português e matemática, era só isso: datilografia, português e matemática. Mas a primeira eliminatória, assim, que eram mil candidatos e na época passaram 110 na datilografia, em português filtrou mais umas 70 mais ou menos, que ficaram, e depois, que foram admitidos mesmo na época, foram uns 30. Era um filtro muito forte. Banco do Brasil, eu fiz a prova de datilografia e não fui pegar o resultado, porque o resultado da Petrobras saiu e eu não quis ver mais. No BNDES eu não fui fazer prova. A primeira opção era a Petrobras. Não foi a única. Era uma coisa de emprego seguro. Emprego seguro que pagava bem e tinha chance de carreira. Eu não conhecia, eu entrei na Petrobras para me inscrever, eu não conhecia nada.

Eu falei: “Ah não, o BNDES eu não sei do que se trata.” A Petrobras era uma empresa grande, todo mundo falava da Petrobras. Eu não sabia bem direito não, mas a Petrobras era muito grande. E eu tinha passado e eu falei: “Eu quero ficar, eu não vou tentar o Banco do Brasil, não!” Pelo que os colegas falaram, eu passei na prova de datilografia do Banco do Brasil também, mas eu não fui nem lá ver, eu não fui mais, não quis. Aí nessa época eu queria realmente ficar na Petrobras, já tinha passado na Petrobras. Aí logo eu fui chamada para começar, logo em dezembro, aí o meu patrão não me deixou sair. Ele não deixou. Ele falou: “Não, você vai sair assim, eu não tenho ninguém para deixar no seu lugar!” Aí eu fui lá na Petrobras conversar com uma pessoa do departamento pessoal, que eu não me lembro quem era, e ela falou assim: “Então tá, em quanto tempo você pode?” eu falei assim: “Eu só vou poder em abril.” Isso era dezembro. Aí ela falou assim: “Em abril, tá, pode ir, em abril você vem aqui!” Eu falei: “Está bom!” Aí eu fui, trabalhei, aí eu tive que prestar aviso prévio de 30 dias na Veplan. Eles estavam me amarrando muito para eu sair. Mas me mandaram embora depois, depois eles me mandaram embora.

Eu pedi para ser mandada embora e eles falaram: “Mas você está admitida na Petrobras, está tudo certo, a gente não quer perder você e nem quer que você fique desempregada.” Aí e voltei lá no departamento pessoal e ela falou assim: “Não, no dia 3 de maio você começa.” Aí dia 17 de abril eu saí da Veplan, fiquei uns dias em casa, 3 de maio eu comecei na Petrobras.

AUXILIAR DE ESCRITÓRIO

Ah, assim, uma expectativa, novo. Eu cheguei num setor - e antigamente tínhamos pool de datilografia. Quando chegava no departamento pessoal, eles tinham um grupo assim de dez e eles falavam: “Fulano vai para tal lugar, ó, tem esse lugar e esse.” Aí ela falou para mim: “Tem o departamento pessoal e tem a área de produção, eles estão precisando de uma menina lá no pool.” Eu falei assim: “Ah, eu quero ir para a área de produção. Departamento pessoal eu já vim lá da Veplan, eu não quero mais, não. Atender pessoas no balcão, essas coisas, eu não quero mais, não.” Aí ela falou assim: “Então tá, vai!” Aí eu fui para trabalhar no pool de datilografia do antigo Depro. Eu era auxiliar de escritório, que era, assim, o primeiro plano de uma carreira administrativa. Naquela época as provas eram: 500 toques por minuto numa máquina Olivetti manual - e a prova, inclusive, era na escola da Olivetti; bom português; ginásio completo; português, uma excelente gramática e escrita também; e excelente matemática. Básico, tudo básico, mas tinha que ser muito bom. E o diploma. E a prova, que era prova de conhecimentos. E tinha que ter no mínimo 500 toques por minuto, senão você não passava.

Na época a Petrobras tinha um pool de datilógrafos por departamento, e tinha o departamento de produção. Eu fui para a produção, departamento de produção. Era assim: a produção trabalhava na época, inclusive muito para a área da Bahia, Salvador, e tinha vários setores. Tinha o setor que aprovava compra de equipamento, setor que aprovava visita no campo, tinha várias áreas, áreas de material. Então, todos esses engenheiros trabalhavam, iam, faziam viagens para a Bahia, para os campos de petróleo, e voltavam com relatórios, e os relatórios eram datilografados por esse pool de datilografia. Era uma fila de umas oito, mais ou menos. Aí tinha a secretária da divisão, da nossa divisão, que era a divisão de material, que distribuía o trabalho. Dona Zélia, me lembro da dona Zélia. E a dona Zélia chegou... Quando eu cheguei, você quer saber da minha chegada na Petrobras? No dia que eu cheguei, a dona Zélia olhou para mim e falou: “Você parece com uma moça chamada - não sei se Edna ou Léia - que trabalhou aqui na Petrobras e não passou no estágio probatório, porque eu reprovei!” Olhou para a minha cara assim: “Você parece muito com ela!”

E todo péssimo serviço, todo serviço grande, todo relatório grande - relatório grande que a gente diz é 10 páginas, 15 páginas - a dona Zélia botava na minha mesa. E era assim: você batia o relatório, e o relatório era em uma original e seis folhas finas com carbono. Mas aí tinha máquina elétrica, a Petrobras era moderna e tinha máquina elétrica. E o relatório vinha, aí o engenheiro consertava o relatório. Primeiro datilografava numa folha só, rascunho, e ele riscava aquilo tudo. Ela não considerava que você estava com trabalho, ela considerava que aquele trabalho já tinha sido entregue para você, então ela dava um trabalho novo. Então, tinha dia assim que eu tinha três, quatro relatórios desse tamanho assim para datilografar. As cartas para diretor, nós fazíamos muitas cartas para o diretor assinar. Elas tinham a original e oito cópias, e não podia ter um erro. Na datilografia a gente tinha toque mágico, que é esse liquid paper, e na época era toque mágico. Porque era só em papel, ele não tinha em líquido, depois surgiu o líquido uns anos depois. E dona Zélia botava na minha mesa exatamente aquela carta. Se você errasse uma vírgula, você tinha que arrancar aquela folha, jogar fora, botar outra e começar de novo às vezes na última linha. A carta que o diretor assinava não podia ter um erro e nem retrocesso. Não podia ter retrocesso. E ela punha na minha mesa. Ela me amava, você percebe? Ela me amava. Então, eu fiquei um ano lá com a dona Zélia no meu pé. Dona Zélia tinha um problema sério, ela tinha um filho quase cego que fazia faculdade, então, ela é que fazia faculdade, ela estudava para ele. Então ela só fazia isso, era secretária lá do chefe da divisão e ficava o dia inteiro lá passando o caderno do menino a limpo e estudando para ele. E nós trabalhando. Não me dava conversa, e eu, novinha, mas eu gostava de trabalhar lá, os amigos eram muito legais, a turma de lá da coisa. Era a Dora, as meninas, a Vilma, que é minha amiga até hoje. Nós nos dávamos muito bem, nós saíamos na hora do almoço, batíamos papo. E ela achou que ia fazer uma coisa muito ruim para mim. Aí um dia ela falou assim: “Olha, Helena - no ano seguinte, no segundo ano lá -, alguém vai tirar férias e tem que cobrir as férias.” Quem vai? Vai a Helena. Aí eu fiquei conhecendo todo mundo do protocolo, inclusive o serviço do protocolo, fiquei um mês lá. Aí o chefe do protocolo falou assim: “Fica aqui, Helena!” Eu falei: “Não posso.” Aí ele pediu a dona Zélia, e dona Zélia: “Não, ela não pode não!” Voltei para a datilografia.

SECRETÁRIA

A Petrobras em nível de escritório era bem pequena, ela era grande só no pessoal de obra, só nos peões, o pessoal lá da construção civil. Escritório mesmo era bem pequeno. Já era na avenida Chile, décimo-quarto andar daquele prédio. O salário era bom, o salário dobrou, na Petrobras era muito bom, porque superava as expectativas, inclusive salariais e de pessoa. Você dizer para as pessoas que você trabalhava na Petrobras era um troféu. Era um troféu que eu mesma me dei, mas era um troféu. Uma nova etapa. E aí, quando passou esse ano, porque a gente trabalhava na datilografia, mas acabava interagindo com os engenheiros, porque eles tinham que levar o relatório, tinha que consertar. E tinha relatórios que consertava dez vezes, dez vezes.

Mais era compra e parecer técnico de compra para produção. Então comprava-se material para produção. Comprava-se árvore de Natal, porque era extração de petróleo; fazia-se parecer técnico para compra de alguns equipamentos que eu não me lembro, mas era tudo na área de produção. Tinha muitas brocas... Comprava fora e dentro do Brasil. Tinha muita parte de tubulação também, que começaram a fazer a parte dos terminais, não existiam os terminais ainda. Eu não tinha uma noção exata como eu tenho hoje, mas a gente via lá, a Manesmann trabalhava muito com a gente. Então, os relatórios dos engenheiros vinham com muito detalhe. Nós tínhamos tanto trabalho que nós não tínhamos tempo de ler os relatórios, a gente só datilografava. Se viesse em inglês... só o engenheiro Hervey que escrevia relatórios em inglês. E tinha uma menina lá que datilografava relatórios em inglês, e ela não entendia inglês também não, mas ela datilografava e ele corrigia.

Dois meses depois o rapaz, o secretário - tinha um secretário lá na sede - que era secretário dos engenheiros do setor de assistência técnica, do Seat, que eles davam o parecer técnico. Tinham 13 engenheiros, e aí eu fui cobrir as férias do menino lá. Acho que era Jorge, Jorge Luiz, o nome dele. E o chefe desse setor não gostava muito do Jorge Luiz. E eu fui para lá, e aí eles tinham que escrever os relatórios, tinham que escrever os telegramas. Era tudo escrito primeiro no rascunho que ia lá para o setor, para datilografar, para mandar. E eles tinham muita dificuldade. Batia na minha mão aquilo tudo, mal-escrito, e eu consertava, consertava os erros de português, consertava as vírgulas. Trinta dias depois, quando o Jorge voltou, ele falou assim: “O Jorge não vem para cá não, você fica!” E eu passei a ser secretária. Aí eu fui ter mordomia, era amiga de todos eles, eles me paparicavam, assim, demais, e os relatórios já aí era eu que escrevia, eu não datilografava mais. Um ano depois.

Olha só, o nosso chefe de setor era uma pessoa muito séria, era o Luiz Pires. O Luiz Pires era uma pessoa muito séria, ele é meu amigo até hoje, eu sou muito amiga das pessoas que trabalharam comigo. O Luiz Pires era muito sério na época, e ele era muito rigoroso com os engenheiros, porque eram uns meninos que eram selecionados na faculdade, eles não entravam por concurso público, eles eram os melhores alunos da faculdade e que iam para a Petrobras e começavam como engenheiros estagiários. Então, eles saíam da faculdade, uma pessoa os trazia como engenheiros estagiários e depois eles passavam para engenheiro júnior, engenheiro 1. Eles primeiro faziam um curso de seis meses lá no campo de petróleo lá na Bahia, depois que eles vinham. Alguns vinham para o escritório, outros ficavam lá no campo ralando. Então, os que vinham para o escritório eram a nata, que vinham trabalhar na sede. Só que eles sabiam muito de engenharia, não sabiam escrever, escreviam mal, escreviam errado. E eles colavam, ficavam muito agarrados. Tinha uns que vinham do Nordeste, e formados e tudo, né? Eu me lembro do Hernando, o Hernando veio do Nordeste, não sabia nada. O Cenival também não sabia nada. Sabia escrever, não quer dizer que não sabia nada, era formado engenheiro, mas não tinha um bom português. E o doutor Luiz, na época, né, o doutor Luiz Pires pegava os relatórios assim, riscava, riscava, e aí eles viam: “Ah, meu Deus do céu!” Tinha uns que choravam, era uma coisa. Eu ficava olhando assim, não podia falar nada. Aí nesse período, quando eu cheguei lá, eles começaram a passar o relatório por mim, e eu consertava. Aí depois eu falei assim: “Passa com a sua letra e entrega ao Luiz.” Aí quando chegava na mão do doutor Luiz estava certinho. Então, eles não faziam muitas festas, não. Mas no dia da secretária, no dia do meu aniversário, ah, qualquer dia que eles inventavam, eles me traziam perfume. Eles viajavam e me traziam perfume importado, traziam presente, corte de tecido, caixa de chocolate, um monte de coisa. Flores, eu já saí de lá, de não poder levar para casa, de tantas flores.

A Petrobras não incentivava muito o estudo nessa época, não, não tinha um incentivo muito para a escola, não. Aí eu queria estudar e me formei. Nessa entrada na Petrobras foi, assim, um ano depois eu logo me formei professora. Eu não sabia. Poderia, mas eu não sabia. O Catad, para mim, que na época era o concurso interno para você passar para administrador, era assim... Eu não tive, até pela minha infância, eu não tive essa ambição aguçada de ir acima na empresa, ir mais acima, eu não tive essa ambição aguçada não, e eu não tinha essa ambição anteriormente dentro de mim. Porque às vezes você tem, e eu não. Eu tinha ambição de fazer bem, de trabalhar bem, de até de me formar, mas... Eu não almejava cargos na empresa. Não, porque eu trabalhava com engenheiros, eu não ia ser engenheira, então, eu não via carreira, porque não era a minha cara. Eu cheguei a entrar na faculdade. Eu cheguei a entrar na faculdade, aí eu terminei o namoro com esse rapaz e conheci o meu ex-marido. E aí ele falou: “Ah não, estudar, não! Estudar?” Eu comecei a fazer a faculdade de administração, aí saí. Eu fazia ali no centro da cidade, na Moraes Júnior. Aí comecei, fiz uns seis meses só, aí ele ficou desincentivando e aí eu saí. Aí ele ficou desincentivando mais: “Ah, a gente vai casar e tal.” E aquela coisa de casar. Isso é assim 20, 21 ainda. “A gente vai casar!” Eu casei com 20 para 21. “A gente vai casar, você está com esse negócio de estudar?” E eu falei: “Então tá.” E aí comecei a me preparar para casar e tudo. Aí tinha muita ocupação na igreja, eu dava aula na Igreja, ensinava outras pessoas, a alfabetização, né? Tem um monte de gente nessas igrejas que não sabe ler nem escrever, e eu ajudava lá. E ajudava as pessoas na Igreja, tinha muita ocupação mesmo na Igreja. Saía para fazer evangelização de rua, então, tinha a minha vida muito ocupada. Tinha o meu trabalho. Mas sempre eu estava com muita necessidade de estudar.

TRANSFERÊNCIA PARA A REDUC

Aí eu me preparo mesmo para casar, já próximo do casamento, assim, faltando uns seis meses para eu me casar, eu chego para o Luiz Pires e falo assim: “Luiz, olha, aqui está muito longe, está difícil, eu vou me casar - nessa época a gente chamava doutor Luiz Pires - e eu queria muito me transferir para a Reduc.” E eu conheci naquela época, assim, de conversas de banheiro, uma moça chamada Zuleica, que ela tinha vindo da Reduc. E tinha uma moça lá da Reduc, Maria Amélia, querendo vir para a cidade, e aí tinha que fazer uma permuta. Aí ela falou assim: “Olha, já que você quer ir, permuta com a Maria Amélia. A Maria Amélia vem para o seu lugar e você vai para o lugar dela.” Aí eu falei: “Então está bom, vou pedir para o Luiz Pires!” Aí eu fui pedir e ele falou assim: “Faz uma carta, faz um relatório - o negócio dele era tudo, assim formal - que eu vou levar esse relatório para o chefe da divisão.” Doutor Alberto, doutor Roberto, eu não me lembro o nome. Aí eu escrevi lá todas as minhas necessidades, os meus anseios, ele achou ótimo e me liberou. Para mim tudo bem, eu achei que realmente seria bom, porque tinha ônibus, eu morava em Nilópolis, aí tinha ônibus para me pegar em casa. Pegava às sete e quinze, ou sete horas na Reduc, e umas quatro e meia estava em casa. Era cedo. Aí cheguei na Reduc, e a Reduc foi, assim, um sonho. Trabalhar na Petrobras, na Reduc, naquela época, foi um sonho. Eu era uma filhota, eu era a mais garotinha do grupo todo, que na Reduc as moças são todas adultas, os senhores, é todo mundo já mais velho, e eu era a garotinha do setor, mas eu era aquela garotinha que todo mundo amava. Eu fui trabalhar na contabilidade na Reduc, numa área de custo, e aí eu aprendi o serviço de contabilidade. Isso foi em início de 1979, eu fui para lá em junho, julho, após as minhas férias, e quando chegou em novembro era o meu casamento. Toda a divisão foi ao meu casamento, a divisão inteira foi ao meu casamento.

A Reduc - Refinaria Duque de Caxias - é uma unidade de produção, é uma fábrica, é uma fábrica. A gente falava que a Reduc era uma fábrica em que a gente não via a matéria-prima entrar e nem via sair. É, você não vê, mas se produz, se produz nafta, se produz gasolina, se produz óleo diesel. Lá pelo menos na Reduc, porque cada refinaria tem a sua especialidade. Na Reduc eram produzidos os óleos mais nobres, hoje eu não sei. A nafta, que se começou a produzir na Reduc, e a borra de petróleo que ia para uma fábrica do lado da Reduc, que foi construída só para se fazer borracha de pneu, que era a Fabor, Fábrica de Borracha.

Apesar de não ter o luxo da sede, eu cheguei lá uns dois meses depois que inaugurou o prédio que a gente chamava o prédio da superintendência, que foi um prédio que inauguraram só para ter escritórios. Então, eu cheguei com móveis novos, eu cheguei numa época boa em que não se trabalhava mais nos barracos, já se trabalhava num prédio administrativo. E o aconchego das pessoas. Na Reduc eu encontrei pai, mãe, irmãos e carinho de amigos, que eram pessoas do escritório. As pessoas que trabalhavam na unidade produtiva não iam ao escritório. Tínhamos contato pequeno, assim, quando encontrava no banco. Mas na Reduc, inclusive o restaurante era separado; a Reduc tem três restaurantes. Tem um restaurante - tinha, hoje em dia eles já uniformizaram - só para gerentes e chefes; tinha o restaurante B, que era o restaurante só para a nossa classe de escritório; e tinha o restaurante para os peões, que era o bandejão. Então, a gente era separada. Tinha três restaurantes separados. O pessoal do macacão sujo de graxa não almoçava no restaurante.

Na Reduc eu tive a oportunidade de participar de um clube, de fazer esporte, naquela época. Porque eu gosto muito de esporte. Eu não sou nenhuma esportista, mas eu gosto de caminhada, eu gosto de natação, eu gosto de uma porção de coisas assim, de esportes assim, de ginástica, de corrida. E aí na Reduc eu achei essa oportunidade. E você não quisesse ir para o restaurante almoçar, tinha um ônibus que ia para o clube da Petrobras. É Creduc - Clube dos Empregados da Reduc, um clube com piscina, uma estrutura completa com professores de natação, professores diversos. Podia usar final de semana. Tinha show, alguns finais de semana tinha show de um artista, e nós nos reuníamos lá no salão de festas do clube. Era gratuito.

O trabalho na Reduc era de um escritório normal. Era um trabalho de contabilidade, que eu não sabia fazer, eu não sabia, eu não sabia nada de contabilidade, eu fui aprender contabilidade e custos. Nós tínhamos que fazer notas de crédito, notas de débito, tudo que entrava, tudo que saía, tudo passava por lá. E era tudo feito à mão: notas fiscais feitas à mão, nota de débito, nota de crédito. Alguns produtos nós tínhamos que prestar conta ao Conselho Nacional de Petróleo, e tudo da própria unidade tinha que prestar conta, como era o caso do querosene de aviação que era usado no Galeão. Eu não tinha profundidade disso, mas eu comecei a entender da contabilidade. Eu me casei, passou , assim, uns seis meses que eu tinha me casado, aí o meu chefe me chamou e falou assim: “Helena, está na época da promoção, e aqui a gente só promove quem é técnico em contabilidade. Auxiliar de escritório aqui não tem muita vez, não. E eu quero que você volte para a escola e estude contabilidade.” Eu voltei para estudar contabilidade. Eu fiz um adendo ao segundo grau. Tinha mais de seis meses que eu estava na Reduc, tinha um ano mais ou menos, ele me chamou e falou: “Helena, eu não posso dar a promoção, a gente não promove auxiliar de escritório aqui, e você trabalha bem, eu quero que você faça o curso de contabilidade.” Aí eu voltei a estudar já casada, aí o meu marido, que estudava, parou de estudar. Porque eu já tinha o meu filho pequeno, e alguém tinha que ficar com o menino. E ele falou assim: “Não, eu fico, você pode ir!” Aí ele parou o curso, a escola dele que ele fazia e eu voltei a estudar. Ele é técnico de refrigeração. E ele ia continuar um curso na Escola Técnica Resende Ramos, ia fazer engenharia, ia estudar mais.

TÉCNICA DE CONTABILIDADE NO CENPES

Eu tinha que fazer 2 anos de curso, né? Nos final dos 2 anos do curso surgiu um concurso, mas só que era para o Cenpes, o concurso era para o Cenpes. E aí o Djalma: “Ah, Helena, você vai fazer o concurso!” Aí eu falei: “Ah, eu vou!” E eu não tinha ainda a carteira como técnica de contabilidade, do Conselho, mas aí a gente tinha uma amiga na Reduc, a Soninha; o marido dela trabalhava no Conselho, aí ele arrumou uma carteira p rovisória para mim e eu pude me inscrever. Porque a Petrobras não aceitava inscrição se não tivesse a carteira pelo menos provisória do curso. Aí eu fiz o concurso para técnico de contabilidade do Cenpes. E passei no concurso em primeiro lugar. Concurso interno, mas tinha dez vagas, eu acho, eles queriam preencher sete vagas, e passaram cinco pessoas, porque a prova estava muito difícil. Aí, como eu passei em primeiro lugar, eu pude escolher se eu queria ficar na Reduc ou se queria ir para o Cenpes. Aí eu falei: “Ah, agora eu quero ir!”

Era um Centro de Pesquisa na Ilha do Fundão. Mas como o Cenpes era considerado fora do perímetro urbano, nós tínhamos ônibus também, tinha restaurante, tinha uma infra-estrutura que não me atrapalharia muito. Nesse ínterim eu já tinha minha filha, que nasceu depois, eu estava ainda terminando o curso de contabilidade. Eu sei que eu estudava para o concurso, eu chegava do colégio, assim, dez horas, ia dormir, acordava assim por volta de três e meia, quatro horas da manhã, tomava banho, me arrumava, tomava café e começava a estudar. Quando o ônibus buzinava lá na rua, eu saía correndo para pegar o ônibus. Mas eu estudava das três da manhã até a hora de o ônibus passar - seis horas, seis e pouco o ônibus passava. Aí eu estudava direto, eu estudava de manhã. Eu estudei um livro inteirinho, porque o rapaz falou assim: “Se você estudar esse livro, a prova está toda baseada nesse livro, estuda o livro.” Aí eu estudei o livro inteiro. Eu comprei o livro didático e o de exercícios, e estudei ele inteirinho, eu sabia ele inteirinho. Aí na prova caiu o livro todinho, aí não tinha como não passar em primeiro ligar, né? Na prova caiu o livro todo. Ele falou assim: “Este livro cai, sempre cai, estuda o livro.” Eu estudei o livro todo.

Gente, foi uma senhora promoção. Eu ganhei, assim, sete níveis. Sete níveis, em nível salarial na Petrobras, é muita coisa. Eu aumentei sete níveis e ainda por cima podia escolher onde eu queria ficar, se eu queria ficar na Reduc, eu podia escolher. “Olha, você pode escolher!” Porque quem fazia os concursos era a sede, né? “Você pode escolher onde você quer!”

Eu fui como técnica de contabilidade 1. Eu só fui podendo escolher onde eu queria trabalhar, mas eu não fui com uma promoção de chefia. Mas como eu entendia muito de custos, eu ganhei uma carteira de custos.Carteira de custos é quando você... Eu cheguei lá para apropriar documentos. Hoje, documentos que vão direto para o sistema contábil, eram todos feitos à mão, a contabilidade era feita à mão. O débito, o crédito era feito à mão, só que você preenchia as notas fiscais que vinham de todas as áreas do Cenpes, e as pessoas preenchiam as notas como débito, tal, e mandavam para a digitação. Já começa a computação, já tem a área de digitação. Nós não tínhamos computadores, mas já tinha a área de computação.O material vinha para fazer leitura para poder criar o relatório de custos, o relatório da contabilidade em si da empresa. Aí eu fui fazer esse trabalho de custos, aí eu me desenvolvi lá. “Olha, vou te dar a carteira!” O que era a carteira? Era a análise do relatório. Então, só analisavam o relatório aquelas pessoas antigas de contabilidade, que entendiam muito de contabilidade. E eu ganhei a análise do relatório. Análise mesmo, análise crítica.

Todos técnicos, todos sabiam muito, todos eram antigos. Eram todos, assim, muito antigos lá, então eles sabiam muito. Então, eu ainda era nova, né, aí eu ganhei uma carteira para analisar - e aí as coisas ficaram meio complicadas, assim, na questão da amizade, na questão da aceitação. Porque o pessoal da contabilidade, nós somos amigos, então todo mundo brincava muito. Eu não era muito de brincadeira, mas a gente conversava, tínhamos filhos da mesma idade, aquela coisa, aquela acomodação de trabalho, aquela união de trabalho, que vai começando aos poucos. Mas quando a pessoa sabe que você vem da Petrobras, que você já vem da sede, você simplesmente não está chegando, né? Existe uma diferença entre a pessoa que está chegando e a pessoa que está chegando de outra área.

Mas aí eu cheguei e uns 2 anos depois eu comecei a me separar. Porque ninguém se separa hoje: “Olha, estou indo embora, estou pegando a minha mala!” Ou então: “Vai que eu não quero mais você aqui!” Não é assim. Você começa a se separar aos poucos, né, e eu comecei a me separar, e isso trouxe muita angústia, porque separação matrimonial é uma coisa muito complicada em todos os seus sentidos. Então, eu não tinha cabeça para estudar, realmente eu não tinha. Não tinha cabeça para trabalhar bem, não tinha cabeça para mil coisas. Até eu decidir me separar, levou assim uma trajetória de uns 4, 5 anos até o momento em que... Aí eu me mudei muitas vezes de bairro: morei em Nilópolis, depois eu morei em Anchieta, depois eu morei em São Conrado. Não, depois de Anchieta eu morei na Tijuca, morei bastante tempo na Tijuca, depois eu morei em São Conrado um pouco de tempo. Aí em São Conrado o casamento acabou. Quando você começa a mudar muita coisa, o casamento acabou. De São Conrado, aí eu já mudei mesmo, voltei para casa, porque a minha primeira casa é do lado da casa dos meus pais e eu voltei para essa primeira minha casa, já sem o meu marido, nós nos separamos mesmo.

Eu trabalhei no Cenpes durante 18 anos. Por exemplo, nesse período em que eu estava, que eu peguei essa carteira de custos, a contabilidade se separou do orçamento, e aí eles escolheram algumas pessoas para trabalhar no orçamento, e eu fui uma dessas pessoas que foram para o orçamento. Isso foi um período de uns seis meses, um ano, e nós montamos o orçamento. Aí o orçamento era um grupo menor, nós éramos cinco pessoas, aquele grupinho pequeno que está na foto, e nós éramos realmente uma família. Nós começamos no orçamento com a Lúcia Pacheco, que veio montar o orçamento. E foi muito bom. Aí nós ganhamos nosso primeiro computador, um Itautec de oito bits. Nosso primeiro computador. Isso, que ano, gente? Isso é 1989, 1990, por aí. Eu cheguei no Cenpes em 1983, o orçamento começou logo em 1984; em 1984 a gente já tinha o orçamento. Em 1985 nós paramos de fazer aquelas planilhas manuais e fomos para o computador.

Aí nessa época já tinha pessoas novas, de outros concursos, inclusive para a área contábil, e tinha pessoas novas. Aí chegou a Geni, chegou uma turma nova. Quem me marcou muito foi a Geni e algumas pessoas que tinham vindo da Interbrás, que iam também fazer parte desse orçamento. A Interbrás era uma empresa que estava extinguindo setores, e alguns empregados ficaram cedidos lá na Petrobras, e alguns vieram para o Cenpes. Naquela época veio uma xará minha, Maria Helena, veio o Mauro, que trabalhou conosco no orçamento, ele tinha muita experiência de orçamento da Interbrás. E apoiaram muito a Lúcia nessa nova trajetória, porque a Lúcia é uma pessoa que veio da área de planejamento para ser chefe nessa área de orçamento, que eles chamavam de setor informal, que você era chefe mas não ganhava nada por isso, só era chefe. Tinha muita responsabilidade. E nós fizemos esse orçamento do Cenpes ser um orçamento respeitado mesmo. Porque aí veio o computador, e com o computador nós fizemos planilhas eletrônicas para acompanhar o orçamento. Inclusive, nós tivemos que fazer cursos da IBM, que era para aprender a lidar, a buscar os gastos dentro do orçamento Petrobras, que ainda hoje é dentro de um ambiente IBM.

Olha, para mim, para a Geni, para algumas pessoas novas foi ótimo. E nós junto com o computador recebemos também umas pessoas de informática para poder fazer lá os programas, e foi muito bom. Agora, para a Talita, que já tinha muitos anos de Petrobras, ela logo quis se aposentar, e ela disse: “Eu não vou mexer com esse negócio não!” Para algumas pessoas foi triste. Houve resistência. Que ela fazia as planilhas dela na mão e dava tão certo, ela somava tudo na mão, como que ia ser o computador? E ela realmente foi uma das pessoas que marcaram, porque ela realmente não aprendeu nada de computação. A Talita saiu.

Aí começou realmente a fomentar a parte de treinamento e desenvolvimento, porque nós precisávamos disso. E aí nós aprendemos planilhas. Aí para nós chegou esse computador e para a área administrativa chegou a primeira máquina de datilografia visual, que era elétrica, que era Edit Vídeo, que só fazia texto, e para nós chegou o computador mesmo. Mas era um computador pequeno, a gente começou a se familiarizar com ele, a pegar intimidade. E eu continuei na minha carteira de custos, mas já com uma análise bem mais avançada, porque aí nesse ínterim eu já tinha um aprofundamento maior do orçamento, então já criticava mais. Porque eu sabia criticar tanto a realização como a previsão, eu sabia escrever sobre aquilo. Aí eu já sabia me reportar à área de planejamento na sede, o chefe já me deixava livre, eu tinha minha carteira para conversar livremente com a sede, vir à sede, discutir coisas, fazer parte de grupos de trabalho na área de planejamento.

ÁREA DE SAÚDE

Vamos contar aí como é que eu saio do orçamento. Essa primeira chefe do orçamento sai, volta para a sede, vem um rapaz chefiar, o Pacheco, que a gente trabalhou muito tempo, muito bem no orçamento. E nessa época eu comecei a achar que eu precisava começar a me encontrar, e aí eu comecei a fazer cursos de criatividade, auto-estima, todos os cursos que a empresa oferecia nessa área interpessoal, lá ia eu. Eu me oferecia, e o chefe deixava eu ir. “Vai, Helena, vai!” Aí teve um curso, que é meio holístico, pela paz, um curso que nós fizemos. E esses cursos davam os insights, davam livros para ler, e eu fui começando a me encontrar, e eu fui começando a buscar o meu caminho. Aí eu fui para o coral do Cenpes e eu comecei a participar do coral - eu comecei desde a minha separação a me afastar da igreja. E me mudei para Higienópolis, montei a minha casa, meu apartamento em Higienópolis, assumi meus filhos sozinha e me encontrei. Deixei a Igreja, enfrentei minha mãe, cortei os laços. E descobri num curso de desenvolvimento de pessoas, desenvolvimento de supervisores, que é aquele curso que você faz em hotel, em que você faz imersão, o quanto eu gostava de trabalhar com pessoas. E a gerência sempre observa, né, os seus gerenciados, o bom líder, eles sempre observam. E nessa época o nosso líder era o Zé Augusto, e ele observava muito isso, o Pacheco também. E aí surgiu um problema na área médica, que era da mesma divisão, e ele resolveu criar uma coordenação administrativa dentro da área médica, e me chamou na sala dele.

O Pacheco entra na sala e fala assim: “Helena, o Zé Augusto está te chamando lá. Vai lá, ele quer falar contigo.” E eu falei: “Eu vou lá!” Aí eu entrei na sala do Zé, e ele falou: “Helena, eu quero fazer uma coordenação, eu quero mudar uma área de saúde, criar uma coordenação administrativa e deixar os médicos cuidando só da parte médica, e eu não tenho outra pessoa para convidar, eu estou convidando você.” Quer dizer. Ele não perguntou se eu queria ir. E eu cheguei na área médica, tinha tido um problema, tinha mudado tudo lá. As pessoas falaram: “Essa aqui chegou para fazer uma varrida.” E o Zé Augusto, que é um homem alto, forte, chegou com aquele grupo e falou: “Olha, a Helena está vindo aqui para dar uma mudada em tudo isso aqui, ela tem o meu aval para fazer o que quiser!” Mas muito diferente da expectativa das pessoas de lá. Porque as pessoas disseram: “Ih, agora isso aqui vai ser uma coisa!” E foi para mim uma coisa muito grandiosa, para mim, porque eu fui trabalhar com pessoas, eu fui aprender a trabalhar com os sistemas da área médica. Porque eu não sabia nada, sabe o que é nada? Eu fui aprender a trabalhar com os sistemas da área médica.

Eu fui estudar em casa. Vinha de muito dos meus cursos que eu já vinha fazendo, eu só fui mais seguindo aquela base que eu tinha dos cursos. Porque eu fiz muitos cursos de interpessoal, fiz por minha conta, fiz por conta da empresa, fiz muitos, fiz muitos cursos nessa área, fiz muitos cursos em desenvolvimento pessoal, fiz trabalho terapêutico mesmo, e comecei a interagir muito com as pessoas. Na área médica você lida com as pessoas, com os problemas. A pessoa só vem na dor, ninguém vai na área médica.

Eu não saí do setor de saúde, eu não consigo sair do setor de saúde, meu coração está lá dentro. O setor de saúde se formou, depois do derramamento se criou o SMS, que é a Gerência de Segurança, Saúde e Meio Ambiente, então a saúde ficou ali dentro do SMS. Então, nós começamos uns processos de certificação, né, porque foi todo um caminhar pós. Tem a Petrobras antes dos derramamentos. Porque não teve derramamento só aqui no Rio, teve derramamento também em outras unidades da Petrobras.

TRABALHO NO RH

Deixa eu contar para vocês um pouquinho desse pedaço, que eu não tenho uma rotina de trabalho. O que aconteceu? Eu, nessa onda de SMS, aprendendo gestão de RH, essa coisa toda, aí nós nos certificamos, foi tudo ótimo, tudo bom, eu me desliguei completamente e aí já consegui um espaço em outra área para que estivesse fora. Eu trabalhei na saúde com Qualidade de Vida, nós implantamos todo o Programa de Qualidade de Vida, mas eu também já fazia outros trabalhos de processos, acompanhamento de contratos, coisas assim mais gestão mesmo, mas maior do que, assim, um pedacinho, né? E nesse nível de gestão o gerente do RH vai e fala assim: “Ah, Helena, agora vai mudar muita coisa e tal. Você não quer vir trabalhar aqui no RH?” Ele vivia me assediando havia muito tempo, aí eu digo: “Não, agora está na hora de eu ir para o RH!” Aí fui trabalhar no RH e me desliguei completamente da área de SMS, e achei assim: “Vou trabalhar agora só com pessoas mesmo. RH!” Aí cheguei no RH, trabalhei um mês, trabalhei novembro, isso agora novembro de 2002, e quando foi dezembro nós fizemos nosso encontro de RH, onde definimos metas e definimos quem gostava de fazer o quê, definimos novos nomes para as áreas, foram definidos novos coordenadores de área, novos responsáveis de carteira.

E eu fiquei responsável pela carteira de T e D, que é Treinamento e Desenvolvimento de todo o Cenpes; e trabalharia também com o GDL, que é a Gestão de Desenvolvimento de Líderes; e trabalharia com GDP, que é Gestão e Desenvolvimento de Pessoas; também com Ambiência, que era um trabalho feito pós-clima; e com mapeamento de competências. E eu falei: “Estou completa na área de pessoas, vou ter coisas à beça para fazer!” Só que todo esse trabalho, gente, gera um estresse muito grande, porque quando você se doa muito, as pessoas te sugam mais. Você sabe que quando você se doa as pessoas te sugam, e tem aquelas pessoas em volta que não têm o mesmo objetivo que eu. Então, realmente, dá a hora do almoço, ele vai almoçar, dá a hora do café, ele pára para tomar café, dá a hora de ir embora, ele vai embora. E a Helena, desde que foi para área de saúde, nunca mais fez isso: nunca mais teve horário de café, nunca mais teve horário de almoço, nunca mais teve horário de ir embora.

Aí é o sábado, é o domingo. Até para a certificação mesmo a gente trabalhou horas e horas, era sábado e domingo até dez da noite, faltava na faculdade e ficava no trabalho. Sábado: “Ah, mas eu tenho que dar um pulinho lá!” E tudo isso. E eu cheguei no RH e falei assim: “Não, eu acho que no RH eu vou fazer um pouco menos!” Mas nada, no RH eu comecei a dobrar isso tudo, isso começou a aumentar. Como eu já venho de um processo, assim, de “está bom, vamos trabalhar”, mas vamos nos preservar também. Eu implantei um Programa de Qualidade de Vida de que eu não podia participar, eu não tinha tempo, não tinha tempo de fazer ginástica, não tinha tempo de fazer ioga. Eu faço ioga também, eu faço outras atividades, e não dava tempo de ir. Eu falei: “Não, aqui no RH eu não sei, mas não está dando certo!” Isso foi em janeiro, aí em fevereiro eu chamei o meu coordenador imediato e falei: “Olha, se não mudar alguma coisa aqui eu vou sair, eu vou embora. Não é isso que eu quero, não. Hoje eu quero mais, eu quero muito mais, mas eu quero também estar bem!” Aí ele colocou mais duas pessoas para trabalhar comigo.

E a gente estava caminhando, e de repente eu recebo, num sábado em fevereiro, antes do Carnaval, eu estou no shopping e recebo uma ligação de uma amiga minha que estava na universidade: “Helena, eu tenho uma vaga no SGI.” E já tinha outros amigos meus do Cenpes que já tinham embarcado para trabalhar na Gestão Integrada, no SGI. E eu falei: “Olha, se surgir uma oportunidade, de repente eu vou fazer uma experiência, porque eu vou ter mais tempo e eu tenho um projeto de vida que eu preciso começar a trabalhar ele, e eu não estou tendo tempo para isso, o projeto não pode se apagar. Eu estou quase na hora de me aposentar e eu tenho que trabalhar no projeto, e eu tenho um projeto de doação, eu preciso me dedicar muito a esse projeto, e não está dando tempo.” Então ela falou assim: “Então você quer ter tempo livre? Vem para a plataforma!” Isso foi em fevereiro. Aí de repente, sábado eu recebo essa ligação e ela fala assim: “Olha, eu passei seu telefone para uma amiga que está mudando de área, que vai para a produção, e precisa de uma pessoa com o seu perfil para trabalhar na P32. Ela vai te ligar.”

Eu falei: “O quê?” Eu estava dentro do carro no shopping. Aí eu parei assim e falei: “O quê? Gente!” E aí quando eu cheguei em casa a menina ligou, ela ligou para o meu celular, e eu falei assim: “Não, liga que eu estou em casa.” Ela ligou para a minha casa, era a Marta, e falando: “Helena, fulano da universidade tal me indicou você e tal, o que você acha e tal?” Eu aceitei. Ela falou assim: “Tem certeza?” Eu falei: “Segunda-feira eu estou falando com o meu gerente, ele está de férias, mas eu vou ligar para ele e vou!” E aí ela falou: “Então tá, marca o seu embarque para quinta-feira depois do Carnaval.” Eu falei: “Tá bom, pode marcar!” Ela falou assim: “Mas tem que falar com o seu gerente primeiro!” Eu falei assim: “Não, pode deixar, eu vou falar.” Aí liguei para o meu gerente, que estava de férias, e falei: “Eu quero falar contigo, é particular, é um assunto sério.” Ele falou assim: “Helena, por acaso eu estou entrando aqui no Cenpes porque eu vim ver não sei o quê.” Ele chegou, eu fui na sala dele e falei: “Olha Pereira, eu recebi um convite no fim-de-semana e tal, tal, tal e eu estou indo. Eu preciso contar com o seu apoio, com a sua ajuda.” Aí ele falou assim: “Ótimo, vai!”

TRABALHO NA PLATAFORMA

E eu fui para a plataforma, e fiquei esses meses só no RH e fui para a plataforma, e aquele embarque da entrevista era o meu segundo embarque. Mas eu já estou completamente integrada com a plataforma. A plataforma é um trabalho em que você trabalha 14 dias em confinamento. No início ficaria 14, mas agora teve uma decisão há poucos dias na empresa, e a gente vai ter o turno de 21. Então são 14 por 21. Então, 14 dias a gente fica embarcada tratando exatamente dos processos da manutenção da certificação de todos os processos, tanto do SMS como Qualidade. Tudo que eu queria em nível de, eu digo assim, de final de carreira na Petrobras. Em nível de pessoas. Porque lá o SGI cuida da Ambiência, cuida das palestras, cuida dos cursos, cuida das necessidades dos empregados e dos contratados. Sendo que 10% de pessoas empregadas Petrobras e 90% contratadas. E a gente tem que cuidar dessa ambiência, para que essas pessoas não se sintam priorizadas, não se sintam diferenciadas, dentro do possível, e é a pessoa, o coordenador do SGI que cuida disso. Então, eu falei: “É isso que eu quero fazer!” E trabalhar embarcada é simplesmente se afastar um pouco da cidade, ficar um pouco em alto-mar. Eu não tenho medo das coisas, eu não tenho medo do futuro. E o meu projeto é muito importante, por ele eu faria grandes sacrifícios. Não é sacrifício nenhum trabalhar embarcada, mas se tivesse outros sacrifícios para fazer eu faria.

DERRAMAMENTO DE ÓLEO

E aí aconteceu o derramamento, nós estávamos lá na saúde, e aí como precisou ter voluntários para trabalhar junto com as pessoas, eu falei assim: “Sou eu!” Tudo o que era voluntariado: “Eu vou!” Eu estava sempre voluntária. E fomos trabalhar. E o derramamento foi muito feio, trouxe uma imagem. O derramamento de óleo foi no ano de... Gente, o tempo passa tão rápido, mas eu acredito que tenha sido em 1996, por aí. Passa muito rápido. Eu sou muito ruim de data, eu sou muito ruim de lembrar. Lembro de eventos, mas data para mim é muito difícil.

O derramamento foi em toda a Baía da Guanabara, foi um grande derramamento de óleo. O que aconteceu? Existe o que a gente chama de download, que é uma transferência de óleo ou de produto de uma plataforma, ou para o navio ou direto para uma unidade de refino, que é recebido nos terminais. Isso tudo vai por meio de dutos que passam no fundo do mar, né? E uma dessas transferências teve um problema de processamento, numa dessas transferências uma dessas linhas de transferência se rompeu. O operador que estava mandando não viu, e o operador que estava recebendo também não viu. Vazou, do que a gente sabe, eu também sei o que os jornais sabem, que vazou óleo por mais de três horas em grande abundância, porque houve um bombeamento de muito óleo em toda a Baía da Guanabara. Contaminou toda a baía. Gente, contaminou de uma forma, assim, a vivência disso foi muito triste de você ver. Uma grande tristeza foi ver o nome da Petrobras denegrido em toda mídia, em toda população. Isso dói muito para o petroleiro, para uma pessoa que vem de muito tempo na empresa e sabe que não é isso que a empresa almeja. Isso dói muito, isso foi muito doloroso, é como falar mal da nossa mãe. Foi muito emocionante a gente passar por isso. E eu não podia deixar de ser voluntária e ir lá ajudar aquele povo e dizer para aquele povo que a Petrobras não tinha a intenção de prejudicar eles. O povo estava muito revoltado. Então, eles fizeram grupos das áreas e eu fiquei na área mesmo da Ilha junto com mais duas assistentes sociais.

Nós trabalhamos numa ilha chamada... Como é o nome lá? Dentro da ilha, e é uma ilha de pescadores mesmo, e essa ilha ficou muito afetada. A gente via a rede dos pescadores toda cheia de óleo, aquele óleo preto mesmo, mas muito óleo. E todo mundo trabalhando, e a Petrobras, a gente acabou fazendo um trabalho, assim, atendendo pessoas da comunidade. E nós fomos trabalhar para fazer inscrição para aquelas pessoas, para a Petrobras ver o que ia fazer, nós fomos nas casas fazer entrevista. E teve algumas pessoas que ficaram doentes, pessoas que ficaram sem comida porque trabalhavam da pesca, e outras também se aproveitam da oportunidade para tirar ganhos. Mas não dava para separar. O desastre foi tão grande que não dava para separar quem estava sendo afetado e quem estava se aproveitando. Porque toda a comunidade é muito carente, a comunidade lá da área da pesca. E a gente trabalhou muito lá conversando com as pessoas, não só levando ajuda, ajuda mesmo como cesta básica, inscrição, dando atenção, como também tentando mudar essa imagem junto às comunidades. E nós ficamos amigos das pessoas, nós almoçávamos, eles ofereceram almoço, caranguejada, eles eram pessoas muito boas, sabe? “Olha, você vêm comer um peixe!” Aí no outro dia eles tinham um peixe preparado lá para nós. Nós estávamos sábado, domingo, até tarde da noite. Dentro da Petrobras, dentro da Petrobras. Foi um grande momento.

Na Petrobras a área de comunicação com os empregados é uma coisa muito forte. Inclusive, quando aconteceu o derramamento nós já estávamos em plena era da informática, em que a informação vem rápido pelo computador, acesso a correio, a e-mails, e isso era muito claro. Na verdade a privatização nunca me amedrontou, eu nunca tive medo da privatização. Mesmo que a Petrobras me demitisse, porque aí eu já sabia que fazer outra coisa, eu já sabia que o meu negócio eram pessoas. Então, tanto dentro ou fora da Petrobras eu vou trabalhar com pessoas.

Então, esse foi um grande marco para a empresa, porque a empresa recuperou sua idoneidade e a sua credibilidade. Juntou a comunidade interna e a comunidade externa. E eu fui nessa onda, eu não parei. Eu não furei a onda e não cortei a onda, eu fui na onda do SMS. E na onda do SMS não tinha só saúde, aí nós tínhamos o meio ambiente para cuidar, nós tínhamos uma segurança e tínhamos um processo de certificação. Aí eu fui realmente estudar. Eu voltei a estudar recursos humanos, porque eu queria me formar para entender melhor as áreas. Porque a gestão em recursos humanos já é uma gestão em que você estuda toda a integração dessa área, e eu queria entender essa integração dessa área bem, tanto na parte dos livros, na faculdade, como dentro da empresa.

SINDICATO

O sindicato tem duas faces, e a minha ação com pessoas é outra. As que eu vejo, né? Eu vejo duas faces do sindicato. O sindicato precisa ter. O sindicato tem o lado político e tem o lado de pessoas, humanitário. Então, o sindicato é uma entidade criada para justamente negociar com empresários, então ele precisa ter essas duas faces: aquele sindicato que pega pesado, que bate pesado, que quer greve, que quer ir contra a empresa; e aquele sindicato que senta e negocia. E eu não sei fazer isso direito, não sei fazer. E por não saber fazer eu nunca me envolvi muito nesse lado não, e nem quero.

QUALIDADE TOTAL

Mas primeiro, no Cenpes nós não implantamos a Qualidade primeiro. No Cenpes, inclusive, tem áreas classificadas na Qualidade, porque a Qualidade certifica processos, e o processo de administração, a parte administrativa não tinha sido ainda. No Cenpes ainda vai ser certificada. Nós certificamos primeiro a gestão de SMS. Então eu fui entender, eu fui fazer cursos internos da empresa, de auditoria. Eu sou auditora na área de processo de SMS, e eu fui atuar como auditora interna. Então eu tive que me desligar um pouco da saúde, e eu fui me desligando aos poucos da saúde porque eu fui na onda do SMS, eu não fiquei presa lá na área de saúde. Eu deixei a onda me levar, e foi muito bom porque eu aprendi muito e interagi com outras pessoas que também estavam nessa onda, eu não fui sozinha, pessoas que queriam também saber muito de saúde, segurança e meio ambiente. Todas as pessoas foram convidadas. Todas as pessoas do Cenpes foram convidadas.

TRABALHO COM MENORES

Olha, o meu projeto vem assim de um projeto que eu comecei a fazer na área médica, que é trabalhar com menores. Porque a empresa trabalha com esses menores ensinando. É o Projeto Iniciação ao Trabalho. Os jovens que começam com 14 e ficam até os 18 aprendendo uma profissão, ou aprendendo alguma coisa de escritório, ou aprendendo alguma coisa de informática, e eles saem para o mercado de trabalho. Só que nesse meu período, nesse período de 10 anos, eu acho que trabalhei com cinco ou seis adolescentes, e eu percebi que esses adolescentes - assim como meus filhos também são da mesma idade – eles hoje não têm trabalho nesse mercado de trabalho que as empresas preparam eles para ir. E nesses jovens não é desenvolvida a criatividade, eles são muito desenvolvidos na área técnica, na área profissional, mas eles não são desenvolvidos dentro da sua criatividade.

E alguém precisa olhar para esses jovens para que eles aprendam a sair dessa empresa que está formando ele para o mercado, e ele vá para o mercado, mas não para ser empregado. Ou para ser empregado, mas se não tiver emprego, que ele seja criativo. E a gente sabe que isso tem que ser desenvolvido, e ele já tem uma raizinha, mas aquilo tem que ser aflorado. E se a gente não fizer um projeto desses, eles vão começar a sair da empresa, não tem emprego e ele pode voltar. Porque ele volta para a comunidade da favela com problema de drogas, com problema de tóxico, dinheiro fácil através lá dos comandos, então ele pode voltar ou ele pode se desestimular porque ele tinha um mundo todo. Porque muitos eu não consegui manter lá na Petrobras como contratado. Eu pretendo fazer um trabalho com esses jovens. É um trabalho que um colega começou a fazer e não pôde continuar por falta de tempo, e ele tem todo o histórico desse trabalho. Quando eu falei com ele, ele falou: “Helena, eu tenho muita coisa desse material.” Eu já estou começando a ler e estudar esse material, logo que esse material vai estar fechado. Eu já falei com alguns coordenadores dessa atividade na ACM, da San Martino e da Escola de Patrulheiros, ali no Caju, e elas gostaram da idéia, são assistentes sociais, e eu vou fazer um projeto com essas crianças. É uma doação, é um trabalho que eu vou fazer gratuito.

Eu já fiz muitos cursos na área de criatividade, então eu tenho muito para passar. Muito para passar e muito para ajudar essas crianças a entender o quanto eles podem aproveitar, ou com uma agulha e uma linha, ou com um barbante, ou com um pedaço de lona, e fazer mercado sem se preocupar com o mercado de trabalho. Esse é o meu projeto, assim como se fosse uma tese que eu quero fazer e eu tenho certeza que eu vou fazer, que vai dar certo. E não quero fazer sozinha, eu quero que quem quiser fazer junto, vamos fazer. Por enquanto eu só tenho o Cariello, que é um amigo que está preocupado com isso, mas de repente tem um grupo maior. E eu também vou fazer uma faculdade agora de psicologia; psicologia é muito importante. Não é para ser psicóloga para ter consultório, mas sim para fazer melhor, cada vez mais, cada vez melhor essa coisa de pessoas. Eu gosto muito desses menores, esses menores me tocam, me trazem assim a minha infância, me trazem assim a necessidade de você saber - e o mercado mudou muito - que tem muita coisa para se fazer. Porque a Petrobras e outras grandes empresas que levam esse jovem para o aprendizado deixam eles muito iludidos quanto ao que é trabalho. Porque dá um computador, dá toda uma infra, e depois eles não têm isso, eles não têm isso.

COTIDIANO

Lá eu sou mulher trabalhando embarcada e sigo as normas da empresa enquanto embarcada, que é uniforme laranja, ou calça ou blusa, ou com macacão, bota para andar na área, capacete, óculos. E isso não tira a feminilidade, sempre de batom.Sempre de batom, sempre unhas pintadas, sempre a gente bota um brochezinho, bota um enfeite, anel, pulseira. E se eu vou trabalhar no escritório eu posso manter isso, se eu tivesse que trabalhar no processamento é claro que eu não podia ter anel, essas coisas, porque tem que botar a luva e tudo. E faz parte do trabalho. Vamos ser uma mulher embarcada. Olha, que eu saiba tem oito mulheres nessa plataforma. Na minha, na P32, tem oito mulheres embarcadas. A cada embarque tem em torno de quatro mulheres e 144 homens. Para mim é um ambiente normal. Ainda não aconteceu, mas se acontecer assim de alguma conversa. Uma conversa paralela, alguma coisa assim que não chega muito aos padrões, a gente enquadra, ué, enquadra. E de repente, eu sou uma mulher livre, separada, e de repente acontece um encontro, um olhar, alguma coisa assim, a gente conversa fora da Petrobras. A gente tem direito a um dia de folga! E também não tem que ser, aquilo ali é um ambiente de trabalho, e a gente ganha para trabalhar. Ali não é um ambiente de carne, tanto que a gente trabalha no que a gente chama de sobreaviso. Você trabalha de sete, com um intervalo de almoço é claro, de sete da manhã às sete da noite, às 19 horas, no escritório, onde for o seu trabalho, e o resto do trabalho você está de sobreaviso. Você pode ter reunião, você pode ter um simulado, então você tem que vestir o uniforme e ir, se tiver uma reunião você veste o uniforme e vai. Fora isso você tem um camarote, você pode botar uma roupa de passeio, desde que seja uma roupa adequada para ir para o lanche, você vai fazer ginástica. Entendeu, a empresa está pagando a gente os 14 dias completos, ela paga 100%. Você ganha para trabalhar e ganha para dormir. Se não der para dormir você tem que voltar a trabalhar.

Filhos

Eu tenho um filhote que vai fazer 22 anos agora no mês de maio, o Eduardo, e a Mariana, que tem 20 anos, e a Mariana já tem um bebê que tem oito meses, que se chama Luiz Eduardo. É muito bom. É muito bom porque faz parte do viver, né, da minha trajetória de vida. Então, quem sabe eu também vou ser até bisavó, já que eu sou jovem assim. Eu falo assim: “Olha, eu sou meio mãe, vó é minha mãe, a minha mãe é que é vó, eu sou meio mãe!”

A VIDA

Eu mudaria, alguma coisa na minha vida eu mudaria. Essa guinada que eu dei uns 12 anos atrás, eu daria aos 20. Porque dos 20 aos 30 e poucos anos eu estagnei, e depois é que eu cresci, entendeu? Eu faria só isso, eu simplesmente teria estudado, me preparado mais cedo e eu teria muito mais oportunidade de ter me doado. Mas graças a Deus estou tendo a oportunidade, então esse momento eu ainda peguei um pouco, ainda sou jovem. Eu não tenho 20 anos, mas eu tenho muita capacidade, muito talento para muitos desafios que vêm aí, dentro da empresa e fora dela.

A Petrobras significa assim: ela é um elo da minha vida, é um elo fortíssimo da minha vida, de toda a minha trajetória de vida. Significa para mim: crescimento, oportunidade, significa amigos, significa vida. A Petrobras para todos que querem e se dão a chance, ela contribui muito. E a Petrobras é para mim a empresa, assim, na minha trajetória de vida. Se eu falasse que a Petrobras é uma pessoa, se eu visse a Petrobras e tivesse que identificar a Petrobras como uma pessoa, eu diria assim que ela é a minha irmã mais velha e minha grande amiga.

MEMÓRIA DOS TRABALHADORES

Emocionante, sabe, eu estou assim embargada um pouquinho, você percebeu que eu estou embargada, porque é emocionante, assim, eu estar revivendo. Eu não estou dando uma entrevista, eu estou revivendo os caminhos que eu já passei. Eu estou revivendo. Eu me sinto, nessa entrevista, sentada na platéia de um teatro me assistindo, assistindo a minha vida passar.

De quem partiu a idéia eu tiro o chapéu. É excelente, a Petrobras precisa disso, porque nós temos muito para contar. Não só eu, mas todas as pessoas que têm uma trajetória, que ama essa empresa e tem muito que contar. Histórias engraçadas, histórias de vida. E para quem criou isso eu tiro o chapéu, porque é a oportunidade que você tem de deixar isso registrado. Porque isso ia ficar para mim, como que alguém ia saber disso?

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